sábado, 27 de outubro de 2007

O CREPÚSCULO DOS DEUSES

Quando Siegfried chega à corte de Gunther, Gutrune, a formosa irmã do rei oferece-lhe a taça mágica do esquecimento. Imediatamente ele perde a memória do passado e de Brunilda, o Espírito da Verdade, tornando-se uma alma nua, pronta para lutar a batalha da vida. Mas ele está armado com a sublime essência da experiência anterior. A espada de Nothung, a coragem do desespero, com a qual combateu a ganância e a crença simbolizadas por Fafner, o dragão, e Wotan, o deus, ainda está com ele; também está com Tarncap, ou o capacete da ilusão, que é um símbolo apropriado para o que nos tempos modernos chamamos de poder hipnótico, pois, aquele que colocasse este capacete mágico em sua cabeça apareceria aos outros em qualquer forma que desejasse. E possui ainda o cavalo de Brunilda, Grane, o discernimento, pelo qual ele próprio pode perceber a verdade e distingui-la do erro e da ilusão. Tem ainda poderes que pode usar para o bem ou para o mal, de acordo com a escolha que fizer.
Como já dissemos anteriormente, nossa idéia do que é a verdade muda à medida que progredimos. Gradativamente estamos galgando a trilha da evolução e, ao fazê-lo, fases da verdade antes nunca percebidas aparecem, e o que nos parecia correto num estágio, pode ser errado em outro. Contudo, toda vez que estamos na carne, vemos através do véu da ilusão simbolizado pela chama de Loge que circunda a rocha de Brunilda. Seu corcel Grane, o discernimento, também está conosco, e se lhe dermos rédea solta, a mente do cérebro material que está impregnada com a bebida letal do esquecimento, nunca poderá ganhar ascendência sobre o Espírito.
A primitiva Época Atlante, quando os homens viviam como inocentes "Filhos da Névoa" (Niebelungos) nas bacias nebulosas da Terra, está representada no Ouro do Reno. O último período Atlante é uma época de selvageria, onde a humanidade renega o amor, como fez Albérico, e forma o "Anel" do egoísmo, empregando suas energias para aquisições materiais simbolizadas pelo "tesouro" dos Niebelungos, pelo qual gigantes, deuses e homens lutam com brutalidade selvagem e vil astúcia, como é representado em "As Valquírias".
A primitiva Época Ária marca o nascimento do idealista, simbolizado pelos "Walsungs" (Siegmund, Sieglinda e Siegfried), uma nova raça que aspira, com sagrado ardor, algo novo e mais elevado - cavaleiros valorosos com coragem de manter suas convicções - estando sempre prontos para lutar pela verdade tal como eles a entendiam, e para dar suas vidas como penhor na defesa de suas sinceras convicções. Assim, a idade da selvageria realista deu lugar a uma era de bravura idealista.
Estamos agora na última fase da Época Ária. Os que procuravam a verdade do passado deixaram mais uma vez a rocha flamejante de Brunilda. Novamente assumimos o véu da carne e compartilhamos da bebida letal. Hoje estamos verdadeiramente participando da última parte do grande drama épico "O Crepúsculo dos Deuses", idêntico em importância ao nosso Apocalipse Cristão. "O Evangelho do Reino" nos tem sido pregado; "O Caminho, a Verdade e a Vida" nos foram abertos do mesmo modo que o foram para Siegfried. Estamos sendo provados agora, como ele o foi na corte de Gunther, para ver se viveremos como "casados com a verdade", ou se a tiraremos de seu refúgio e a prostituiremos, como fez Siegfried. Para ganhar a mão de Gutrune, ele arrebatou da mão de Brunilda o emblema do egoísmo, o Anel do Niebelungo, e colocou-o novamente em seu dedo; prendeu Gutrune e levou-a até Gunther para ser sua esposa. Ele a prostituiu e ele próprio cometeu adultério com Gutrune - pois, tendo uma vez desposado a verdade, é adultério espiritual ambicionar as honras do mundo.
Céu e Terra foram ultrajados por esta tremenda traição à verdade. O grande mundo "Ash", a árvore da vida e do ser, treme em suas raízes, onde Urd, Skuld e Verdende, o passado, o presente e o futuro tecem o fio do destino. Começa a escurecer na Terra; a lança de Hagen encontra o único ponto vulnerável do corpo de Siegfried - sua vida é o castigo, e como o mais alto ideal da época fracassou, não há razão para perpetuar a ordem das coisas existentes. Portanto, Heimdal, o guardião celestial, toca seu clarim e os deuses cavalgam pela última vez em procissão solene pela ponte do arco-íris para enfrentar os gigantes na batalha final, envolvendo a destruição do Céu e da Terra.
Este é um ponto muito significativo, pois na abertura do drama encontramos os Niebelungos "no fundo do rio". Mais tarde, Albérico molda o "Anel" em fogo, que só pode arder na atmosfera límpida como a da Época Ária. Nessa época, os deuses também celebraram suas reuniões sagradas na ponte do arco-íris, que é o reflexo do fogo celestial. Quando Noé conduziu os Semitas originais através do "Dilúvio", ele acendeu o primeiro fogo. "O arco" foi, então, colocado nas nuvens para permanecer por toda a época e, durante esse período, ficou convencionado que os ciclos alternantes, verão e inverno, dia e noite, etc., não cessariam. No Apocalipse (IV: 3), João recebeu instruções referentes às "coisas que virão", por "Alguém que tenha um arco-íris em redor de Si"; e mais tarde (X: 1) "um Anjo poderoso, com um arco-íris em sua cabeça proclamará solenemente o fim dos tempos". Está claro pelo mito nórdico e pelos ensinamentos Cristãos, que a época começou quando o arco foi colocado nas nuvens. Quando o arco for removido, a época terminará e novas condições físicas e espirituais surgirão.
O outro fenômeno acompanhando esta época conturbada é apresentado no antigo mito. Loge, o espírito da ilusão, tem três filhos: a serpente Midgaard - que rodeia a Terra mordendo sua própria cauda - é o elemento aquoso, o oceano que refrata e distorce todo objeto nele mergulhado. Os homens temem este elemento traiçoeiro; sempre empalidecem ao pensar no que pode acontecer quando revolto. O lobo Fenris - a atmosfera - também é filho da ilusão (óptica), e o pavoroso rugir da tempestade pode incutir medo no mais destemido coração. Hel - a morte - é a terceira filha de Loge e "a rainha dos terrores". Antes do homem entrar na existência concreta, como está descrito no começo do grande mito e no Gênesis, sua consciência estava focalizada nos mundos espirituais, onde os elementos ilusórios, Loge (fogo), Fenris (ar), e a Serpente (água) inexistem, portanto, a morte também era desconhecida. Mas, durante a presente época, quando a constituição do corpo humano está sujeita à ação dos elementos, a morte física é uma realidade.
Ao som da trombeta de Heimdal, todos os fatores de destruição atacam a planície de Bigrid, a contra-parte de Armageddon, onde os deuses da crença e seus defensores estavam reunidos para uma última pausa. Os filhos de Muspel (o fogo físico) vindos do sul, atacam demolindo a ponte do arco-íris. Os Gigantes de Gelo avançam vindos do norte. Com um grande rugido, Fenris, a atmosfera condutora da tempestade, lança-se sobre a Terra. Sua velocidade é tão terrível que a fricção gera fogo, pelo que se diz que sua mandíbula inferior está sobre a Terra, a superior alcança o Sol e que de suas narinas saem correntes de fogo. Engole Wotan, o deus que é responsável pela idade do ar, quando o arco estava nas nuvens. A serpente Midgaard, ou elemento aquoso, é vencida por Thor, o deus do raio e do trovão, mas quando as descargas elétricas finalmente acabarem com o elemento água, não poderá mais haver raio e trovão; daí o mito nórdico informar-nos que Thor morre pelos vapores que vêm da serpente. No nosso Apocalipse Cristão, também se fala em relâmpagos e trovões e nos é dito que, finalmente, "não haverá mais mar".
Mas, como a Fenix ressurge rejuvenescida e formosa de suas próprias cinzas, assim também uma nova Terra, visualizada pela antiga profetiza, ressurgirá da grande conflagração, mais bela e mais etérica, onde "os elementos derretem-se com o calor ardente". Ela chamou essa Terra de "Gimle", onde não faltaram habitantes, pois, enquanto a grande conflagração acontecia, um homem e
uma mulher chamados Lif e Liftharaser (lif significa vida) foram salvos, e deles surge uma nova raça que vive em paz e perto de Deus.

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